domingo, 10 de setembro de 2006

É PRECISO TER FÉ

Hoje, por nenhum motivo especial, me dei conta de como é fácil "seguir com a vida" quando terminamos o namoro com alguém. No início, o vazio deixado pelo término dessa relação nos afoga em sensações que vão da saudade à melancolia. Com o passar do tempo, no entanto, os sentimentos que nos envolve são o oposto, de antecipação e promessa. Percebi que isso acontece pq sabemos que esse "fim" será temporário, pois logo encontraremos uma maneira de superar essa perda.

Terminar um namoro nos abre portas para curtir novas experiências ou voltar a experimentar coisas que gostávamos de fazer e tivemos que abrir mão por causa das limitações impostas em nossa última relação. Temos a chance de encontrar um novo amor, de ficar com várias pessoas sem se prender a ninguém, ou mesmo ficar só e apenas curtir as vantagens dessa condição, podendo voltar nossa total atenção aos estudos ou o trabalho, por ex.

Ao chegar a essa conclusão, perguntei-me: por que essa facilidade de superação não se aplica a todas as coisas, então? Por que é tão difícil superar a morte de parentes e amigos próximos, ou mesmo superar o medo da nossa própria morte, por ex? Por que é tão difícil dar adeus a certas coisas, aceitar sua impermanência? Num átimo, a resposta me veio a mente: é preciso acreditar em algo, ter fé.

Quando terminamos com alguém, nós acreditamos que a dor que iremos sentir é temporária e que, mais cedo ou mais tarde, encontraremos uma solução satisfatória para essa questão. Além disso, terminar com alguém não representa um fim irremediável. Para começar, a(o) namorada(o) não morreu, apenas deixou de ser uma pessoa especial para nós. A possibilidade de reatar a relação num futuro próximo ou dos dois continuarem amigos nos conforta. E, mesmo que nada disso aconteça, a certeza que temos de um dia poder encontrar outra pessoa ou de encontrar consolo em outras coisas igualmente significativas nos da forças. E isso, no meu entender, é ter fé.

Essa é a mesma fé que conforta os cristãos na hora da morte, quando “sabem” que, apesar do seu corpo ter chegado ao fim, seu espírito continuará vivo por toda a eternidade junto ao seu Deus, criador de todas as coisas. Essa é a mesma fé que conforta os budistas, que encaram o fim carnal apenas como um ciclo kármico de morte e renascimento evolutivo. Até mesmo os ateus convictos encontram conforto na fé de que a morte representa não só o fim do corpo como da consciência existencial.

Mas a fé não se trata apenas de coisas profundas como a morte. Ela se faz presente até mesmo nas pequenas ações do dia-a-dia. Se você estuda horas a fio para uma prova, por ex, é porque acredita (tem fé) que isso lhe garantirá uma boa nota. A esperança de que tudo irá acabar bem ou que faz sentido “acreditar” é o que te motiva a namorar, fazer amigos (e cultivar essas amizades), fazer um curso, trabalhar, viajar, aceitar teorias científicas e religiosas e até praticar ações negativas, como promover guerras, atentados terroristas ou mesmo se matar.

No final das contas, o “significado da vida” ou o “segredo da felicidade” está intimamente ligado as suas crenças pessoais. Se você acredita em coisas positivas, sua vida ganha significado; se sua vida tem significado, vc é feliz.

A grande questão, porém, é que adquirir uma fé tão inabalável é mais difícil do que parece. Coisas como vida (ou não vida) após a morte e o surgimento do universo são tão subjetivas e carentes de provas concretas que é quase impossível aceitar uma única teoria como verdade absoluta. No que diz respeito a essas duas questões, por ex, eu sinto ainda uma enorme dificuldade em abraçar uma única resposta, deixando de lado tantas outras que fazem igual sentido.

Invejo aqueles que são capazes de acreditar totalmente numa única teoria sobre a morte. Estou certo de que suas vidas são muito mais simples e significativas do que as dos não crentes (como eu).

Para ser feliz, é preciso ter fé. Mas para ter fé, às vezes é preciso optar pelo caminho cômodo da ignorância (ou da “crença cega”). E isso é algo ao qual eu ainda não estou preparado pra fazer.

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